ISSN 2764-8494

ACESSE

Socioambiental
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A incrível história do besouro rola-bosta e outros insetos maravilhosos

Por Amélia Gonzales

Há alguns muitos km daqui

Próximo ao Lago Sagrado, no Templo de Karnak, na cidade de Tebas, no Egito, há várias estátuas feitas em pedra. Uma delas é a de um imenso escaravelho, mais conhecido por nós como besouro. Milhares de turistas passam por ali, mas talvez apenas uma pequena minoria se dê conta da homenagem feita por aquela civilização, que tem cerca de cinco mil anos, a um pequeno inseto.

Certamente eu também jamais estaria contando isso para vocês, não fosse o Atlas dos Insetos, editado pela Fundação Heinrich Böll Stiftung, ter trazido essa história. No Egito, o escaravelho tem uma alusão religiosa, já que esses insetos eram considerados como símbolos da ressurreição. Os egípcios os usavam como amuletos e os esculpiam em tumbas e sarcófagos de grandes faraós.

Escaravelho? Aqui chamamos de outra forma

Entretanto, aqui no Brasil, o escaravelho recebe um nome bem prosaico: rola-bosta. É uma referência ao hábito que ele tem de remover e manipular, em formato esférico, porções de fezes. Essas “bolas” de fezes são transportadas, enterradas e utilizadas por eles para construção de ninhos e para a alimentação de larvas e de adultos. Esses insetos alimentam-se principalmente de fezes de mamíferos, mas também podem se alimentar de fungos, frutas ou carcaças de animais em decomposição.

Partindo da mitologia egípcia

Primeiramente, para os egípcios, o sol nascia e morria todos os dias. Eles acreditavam, assim que o deus Khepri se transformava em um besouro rola-bosta, a fim de “rolar” o sol de um lado para o outro.

Justamente por livrar o pasto das fezes, esses bichos são importantíssimos para o ecossistema, na atualidade. E como livram os quadrúpedes das moscas que picam sua pele os deixam estressados e feridos, também são importantes para os bois e vacas. Além disso, quando movem os excrementos para debaixo da terra eles permitem que nasçam gramíneas. Por serem extremamente sensíveis à degradação do ambiente, são considerados bioindicadores de conservação ambiental, motivo pelo qual são usados em estudos para avaliação de riscos gerados pela perda da biodiversidade no mundo.

Assim, neste ponto, a história do escaravelho começa a ser manchada pelas atitudes humanas. É que, para evitar que o gado fique doente, os produtores aplicam remédio nos bichos, principalmente a ivermectina. A maior parte da eliminação desses remédios é feita pelas fezes, o que gera uma diminuição considerável da atuação dos rola-bostas. Consequentemente, o pasto fica cheio de cocô, ali não nasce grama e o resto é o que já sabemos: o ecossistema fica extremamente prejudicado.

E o que outros insetos tem a ver com isso?

Semelhantemente, a história do escaravelho ou rola-bosta é apenas uma. Os insetos representam cerca de 70% de todas as espécies animais do mundo, e por isto mereceram uma edição bem caprichada, com muitos fatos e muitos dados. Entre outras coisas, é bom lembrar: os insetos polinizam, logo são responsáveis pela nossa comida. Os insetos polinizam três quartos dos plantios mais importantes e impulsionam sua produtividade. Sim, claro, há também aqueles que podem acabar com uma plantação, mas a quantidade de insetos benéficos é muito maior.

Há também a possibilidade de os insetos serem, eles próprios, o alimento. Em mais de 130 países, as pessoas comem insetos que contém muitos nutrientes eficazes contra a desnutrição causada, como se sabe, por má distribuição de alimentos. Não por falta deles.

Existe solução?

Contudo, apesar de sua importância inquestionável, a agricultura intensiva, as monoculturas e os agrotóxicos estão fazendo com que tanto a diversidade quanto os números absolutos de insetos estejam diminuindo dramaticamente. O que fazer? Políticas públicas que possam mudar o cenário atual.

Já está mais do que provado que a agroecologia, os sistemas agroflorestais, que não utilizam fertilizantes ou produtos químicos em sua produção, é a melhor maneira de preservar e respeitar o meio ambiente, ao mesmo tempo que se faz uso dos bens que ele nos oferece. Mas isto não é levado em conta. A Câmara dos Deputados acaba de aprovar o texto-base de um projeto de lei que flexibiliza o controle e a aprovação de agrotóxicos no país. Como se fosse preciso: só em 2019, o governo federal liberou 503 novos agrotóxicos, sendo 41% altamente ou extremamente tóxicos, segundo o Atlas dos Insetos.

Na Dinamarca isto foi resolvido com um imposto bem alto sobre os agrotóxicos. Caiu em um terço a carga tóxica anual dos agrotóxicos no país escandinavo. Mas também pode-se pensar em fazer um controle biológico de pragas para evitar os danos que os insetos possam fazer às plantações. Isto será mais bem sucedido se a diversidade de espécies e do ambiente forem maiores.

Um dos primeiros inimigos naturais utilizados em larga escala, com o objetivo de controlar danos provocados por pragas, é a joaninha. Elas conseguem comer de 40 a 75 pulgões por dia, o que faz com que sejam utilizadas em controle biológico, inclusive em áreas urbanas. Elas também têm história, contada no Atlas que pode ser acessado, gratuitamente, no site da Fundação: https://br.boell.org/pt-br/atlas-dos-insetos. Vale a pena ler e contar para as crianças.

Amelia Gonzalez é jornalista, foi editora por nove anos do caderno Razão Social do jornal ‘O Globo’ e colunista do Portal G1, também da Globo. Atualmente mantém o Blog Ser Sustentável, onde escreve sobre desenvolvimento sustentável e colabora na Revista Colaborativa Pluriverso e aqui, na revista Entrenós, uma parceria da Casa Monte Alegre e a Pluriverso.


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